Deputado Arnaldo Jardim

Álcool, Etanol e o desafio de marcar gols com a globalização - 2007

Arnaldo Jardim

O produto que os brasileiros conheciam como “álcool” ganhou popularidade como “ethanol” no mercado  internacional e virou “etanol” no Brasil. Esta é a melhor prova de que um segmento com origens remotas na cultura colonial do açúcar migrou, definitivamente, para o “mundo plano” global em que as esferas da energia e do agronegócio se superpõem.

 

Daí derivam duas alternativas políticas muito simples: num cenário otimista, o Brasil lidera a política interna e externa do etanol; num cenário pessimista o Brasil perde espaços, assim como perdeu no passado com outras commodities, a exemplo da borracha, o próprio açúcar e até o café.

 

Vamos admitir que o Brasil tenha capacidade política para manter o domínio que ainda tem dentro de campo, disputando campeonatos com saldo favorável de gols e liderando o placar. Não será possível manter essa liderança sem resolver questões de tática e estratégia complicadas.

 

A primeira é como alinhar os interesses do Estado brasileiro e de um agronegócio essencialmente privado. A segunda é uma conseqüência natural da primeira, pois o agronegócio do açúcar e do álcool interage com outro com uma esfera bem mais ampla:  a geração de energia através de várias fontes renováveis e não renováveis, do tipo petróleo, gás, nuclear, solar, eólica etc.

 

Não há, neste espaço, como abordar um cenário tão amplo. Mas podemos lembrar algumas coisas, a começar pelos erros cometidos quando o Brasil criou Institutos e o Estado interferiu pesadamente nos produtos primários (commodities) de exportação. O resultado da intervenção estatal na comercialização foi desastroso. Enquanto o Tesouro brasileiro segurava o guarda-chuva dos preços, os concorrentes cresciam na sombra. O Vietnam produz e exporta, hoje, mais café robusta do que o Brasil.

 

A indústria do açúcar e do álcool colocou o Brasil de volta no placar da liderança global das commodities jogando dentro de leis de mercado: um produto competitivo (petróleo) encareceu, vai acabar, e isso deixou as usinas brasileiras na cara do gol. O problema é que os concorrentes já estão nos calcanhares e a velocidade com que os intermediários financeiros internacionais criam produtos que alavancam a comercialização é maior que a nossa. Existem hoje no terminal eletrônico de uma única plataforma global de informações mais de 140 páginas com índices e ferramentas de mercado para o etanol. Não há como pensar que o Estado brasileiro, sozinho, vai ditar as regras desse jogo de mobilização de capitais e gerenciamento de riscos nos mercados à vista e futuro.

 

Para continuar ganhando na área do etanol é preciso uma interação inteligente e não preconceituosa do Governo com o mercado, destravando o que pode ser destravado para que os traders se organizem e falem, aqui, a mesma língua falada pela turma da liga dos campeões da Europa ou dos Estados Unidos. Se formos lentos, vamos exportar o jogo do etanol do mesmo jeito que exportamos nossos melhores jogadores. Até podemos ganhar alguns campeonatos, mas a renda grossa da bilheteria fica lá fora.

 

Nos países mais desenvolvidos não se confunde regulação com fiscalização. Colocar tudo no mesmo saco é um convite à perda de gols. É a mesma coisa que querer que o juiz de futebol seja também o técnico. A ANP já sinalizou, a propósito, no sentido de que pode deixar o mercado de etanol fluir livremente, tirando a obrigatoriedade da entrega  usina/distribuidor. Outro ponto importante é a isonomia tributária. Soubemos que o nome do contrato futuro de álcool mudou para “etanol” e passou a ser cotado em dólares para contornar as imperfeições da incidência do PIS/COFINS nas operações em real.  Que pena.

 

Nenhum mercado cresce de forma equilibrada sem a participação de traders. A questão do etanol tem sido discutida com a colaboração de técnicos da BM&F, instituição que acumulou um acervo cultural notável à medida que ocupou um dos cinco primeiros lugares entre as bolsas de futuros do mundo. Não é à toa que Dunga de vez em quando vai jogar lá fora. No mínimo, ele aprende como armar melhor a defesa contra os voleios dos ingleses. Vamos pelo menos ouvir com atenção quem já disputa a liga dos campeões.

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