Deputado Arnaldo Jardim

Energia renovável e sustentável para o desenvolvimento - 2012

Arnaldo Jardim

A energia é indispensável à qualidade de vida do ser humano. Significa instrumento de transformação da natureza quando com avanços nas condições de habitabilidade, sobrevivência e evolução humana no planeta. Não há dúvidas, no entanto, de que qualquer forma de gerar energia produz impacto ambiental. Assim, no processo de geração de energia temos que evoluir cada vez mais para que nele seja agregado o princípio da sustentabilidade, que veio para ficar. E a natureza é uma demonstração disso porque a mais formidável fonte de energia é o sol.

 

Os estudos indicam que a energia gerada por nós é parcela ínfima se comparada com a produzida pelo sol. A sustentabilidade é exigência após um passado de uso farto e descriterioso do consumo da energia criada de fontes não renováveis fósseis, principalmente petróleo e carvão mineral. A produção sustentável deve levar em consideração o aproveitamento do recurso pela atual e futuras gerações, bem como se preocupar em gerar oportunidades de diminuição de desigualdades econômicas e sociais.

 

Como um país que ainda se encontra em estágio de desenvolvimento, equacionar uso sustentável de recursos e metas de crescimento não é tarefa que tem se mostrado fácil. Basta observar as reiteradas demora nos  licenciamentos ambientais, causa de grande atraso dos empreendimentos hidrelétricos. Os quais são, ainda, a fonte mais barata de geração de eletricidade.

 

Historicamente o consumo de enrgia, quando analisado, é revelador das desigualdades internacionais!

 Nesse quesito, há muito o que avançar conforme mostram os dados sobre consumo de energia elétrica. O consumo per capita de energia de muitos países é superior ao nos EUA é mais de seis vezes maior do que o brasileiro (veja tabela abaixo). No Brasil a média é de 2.206 mil kWh/ano. Um fato positivo a ser destacado, é a possibilidade de expansão da geração utilizando fontes renováveis de energia. As fontes renováveis de energia também estão em ascensão, enquanto que as fósseis declinam (veja tabela abaixo).

 

Consumo de Energia Elétrica kWh per capita

 

1980

1995

2009

África do Sul

3.644

4.434

4.532

Alemanha

5.797

6.328

6.779

Argentina

1.233

1.648

2.759

Brasil

1.008

1.636

2.206

Chile

922

1.742

3.283

China

282

770

2.631

Estados Unidos

9.862

12.660

12.914

India

140

352

571

Russia

—-

5.110

6.133

Fonte: The World Bank (IEA, Energy Statistics OECD e non-OECD)

Consumo de Energia por tipo

 

Mundo

Brasil

 

1973

2009

1973

2010

Derivado de Petróleo

48,1%

41,3%

46,7%

41,8%

Eletricidade

9,4%

17,3%

6,4%

16,3%

Gás Natural

14,0%

15,2%

0,2%

7,5%

Carvão

13,7%

10,0%

2,2%

4,9%

Biomassa

13,2%

12,9%

44,3%

27,1%

Outras (1)

1,6%

3,3%

0,3%

2,4%

Total (em Mtep) (2)

4.674,0

8.353,0

76,3

241,1

  • Inclui energias geotérmica, solar, eólica, térmica
  • Milhões de toneladas equivalentes de petróleo

Fonte: Almanaque Abril (IEA e MME)

 

Matriz Energética, %

 

2010

2020

Petróleo e Derivados

38,5

31,8

Gás Natural

10,2

14,4

Carvão Mineral e Derivados

5,1

6,1

Urânio e Derivados

1,4

1,4

Hidráulica

14,2

12,5

Lenha, Carvão Vegetal

9,5

8,3

Derivados de cana-de-açúcar

17,7

21,8

Outras renováveis

3,4

3,7

Fonte: EPE – PDE 2020

 

Hoje o mundo consome cada vez mais energia e continuará consumindo. Se quisermos associar o conceito de produção de energia ao de sustentabilidade, isto significa optar por um processo de escolha das fontes de energia para suprir as necessidades humanas com menor impacto ambiental.

 

A consciência internacional sobre sustentabilidade energética se acentuou durante a Rio+20, reafirmando o caminho que ganhou força em 2002 durante a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável da ONU, em Joanesburgo, na África do Sul. Na conferência, o Brasil defendeu a tese na qual 20% da matriz energética deveria ser de fontes renováveis, mas a proposta só se efetivou na Comunidade Europeia, que já incorporou essa orientação na sua diretriz sobre energia.

 

Energia eólica

 

Do ponto de vista de novas fontes de energia amigáveis com a questão ambiental, sem dúvida a mais relevante nos últimos anos desde a constituição da Aneel é a eólica, que teve um boom que se alastrou pela Europa.  Atualmente, a China vem se destacando com a implantação do maior parque eólico do mundo, fonte que também se desdobrou no nosso país. Essa fonte de energia  ganhou muita competitividade por aqui.

 

Seus custos nos últimos leilões se mostraram os mais atraentes no segmento de geração de energia. Temos um processo importante e significativo em relação à evolução de equipamentos para a geração de energia a partir do vento. Mas subsiste o temor no sentido de garantir fontes estáveis para atuarem em complemento ao aumento da participação relativa da energia eólica não só aqui como em todo mundo.

Energia solar

 

Tivemos avanços significativos na fonte de energia solar, um das mais dinâmicas do país. Embora o preço ainda seja pouco competitivo, vislumbramos a possibilidade de ampliação do segmento nos próximos anos. Com evolução de novos equipamentos para geração desse tipo de energia aliado ao smart grid, teremos uma ampliação importante da energia solar na nossa matriz energética.

 

Energia nuclear

 

A energia nuclear merece um debate mais profundado sobre o seu uso no Brasil. A partir do acidente  na usina de Fukushima, no Japão, a energia nuclear foi demonizada. Surpreendeu a mim e a muitos a decisão do governo alemão suspender as operações com suas usinas nucleares numa atitude que pode ter conteúdo eleitoral e emocional, que aguarda muita distância de qualquer decisão de racionalidade do ponto de vista de produção de energia.

 

Muito embora existam problemas inegáveis em relação a destinação dos resíduos gerados pelas usinas atômicas, do ponto de vista da segurança das instalações e da sustentabilidade da energia não tenho dúvida de que deveremos ter uma utilização crescente da energia nuclear.

Combustíveis

 

A busca constante da eficiência energética e da sustentabilidade quanto aos combustíveis para movimentar os automóveis fez surgir a modalidade de motores híbridos, sem contar os carros elétricos.

 

O programa brasileiro de etanol é considerado um sucesso no país e também tem grande repercussão mundial.

No entanto, o desafio do biocombustível é muito grande porque a produção de etanol está estagnada há mais de quatro anos. E não temos sinalização da instalação de novas unidades de produção de etanol.

 

Com isso, o combustível “verde e amarelo” está perdendo competitividade e deixou de ser vantajoso em relação à gasolina, a qual vive um artificialismo de preço. O etanol está em baixa por uma série de fatores, mas principalmente por falta de uma política estável de incentivo a sua produção.

 

A expectativa de ganhar outros mercados pela sua vantagem competitiva e diferencial ecológico fica cada mais distante. O etanol cede espaço na matriz de combustíveis.  Assistimos o aumento do consumo de gasolina importada e o déficit na conta combustíveis. Sob a alegação de que o congelamento de preço é necessário para manter o controle da inflação, o governo cava um buraco que vai custar caro.

 

Com o consumo de combustíveis em alta, a ampliação da frota de veículos flex e a produção de petróleo estagnada, passamos de potencial exportador a bater recordistas na de importação de etanol. De acordo com dados da Secex (Secretaria de Comércio Exterior), o Brasil importou em 2011 um total de 1,1 bilhão de litros de etanol dos EUA produzidos a partir do milho.

 

A crescente importação de etanol e também de gasolina – segundo a ANP, até maio o volume cresceu 315% na comparação com o mesmo período do ano passado – está na contramão do discurso oficial de que o Brasil não pode e não deve abrir mão do uso de energias renováveis e limpas.

A solução para o setor sucroalcooleiro recuperar fôlego depende muito mais da ação do governo do que propriamente do mercado. Se isso não ocorrer, vamos assistir o desmantelamento do complexo sucroenergético, que colocou o Brasil na vanguarda mundial dos biocombustíveis.

 

Não podemos esmorecer na inovação tecnológica aplicada à cultura da cana de açúcar, que em grande parte é responsável pelo boom que a agricultura brasileira vive nos últimos anos. Parece E nem nos esquecer que nos 37 anos de existência do Proálcool, o etanol combustível substituiu mais de 2,2 bilhões de barris de gasolina até junho desse ano, grande contribuição para a redução do chamado efeito estufa.

 

Recentemente, o governo acenou com a possibilidade de zerar tributos que incidem sobre esta cadeia produtiva, como o PIS/Cofins, e aumentar a mistura de etanol à gasolina para 25%, mas a promessa ainda não se materializou, mesmo sendo sozinha insuficiente para dar novo alento ao setor.

 

Além da definição do papel que o etanol deve ter na nossa matriz energética, é preciso estabelecer regras duradouras e criar linhas de crédito para estimular o setor ainda abalado pela crise de 2008 e por fatores climáticos que reduziram a produtividade. Na safra 2011/2012, a produção do biocombustível recuou 17%, o que representa algo em torno de 5 bilhões de litros. A ampliação do parque de moagem e a renovação de canaviais são fundamentais para aumentarmos a oferta de etanol e estabilizarmos o preço do combustível.

 

O Brasil possui a matriz de combustível mais limpa do mundo, um sucesso resultante da utilização do etanol. Temos também o biodiesel, mas é a vertente do etanol que difere o Brasil dos demais países, por ser um combustível limpo, renovável e de baixo custo.

 

Especialistas apontam que nos próximos 10 anos serão necessários a construção de aproximadamente 120 novas usinas sucroalcooleiras para atender a demanda de açúcar – interna e externa – e a produção de etanol anidro para a mistura à gasolina.

 

É preciso, então, um conjunto de medidas de curto, médio e longo prazo para ampliarmos e renovarmos os canaviais, aumentarmos a eficiência das unidades produtoras existentes e estimularmos a construção de novas plantas, e principalmente, criar condições para a utilização da biomassa residual (bagaço e palha) na produção de bioeletricidade, que também perdeu espaço e interesse na atual política adotada para os leilões de energia.

 

Biodiesel

 

O Brasil tem todas as condições de avançar em relação ao biodiesel, especialmente no que se refere à qualidade da mistura de outros óleos vegetais e também na quantidade de mistura, que pode chegar a 20%.

 

Resíduos Sólidos

No Brasil em 2011 foram gerados cerca de 61.936.360 toneladas de resíduos sólidos urbanos, dos quais 58,10% foram destinados em aterros sanitários.

A possibilidade de geração de energia a partir dos resíduos sólidos ganha respaldo legal com o advento da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010) e de seu Decreto Regulamentador (nº 7.404/2010). Fica estabelecido que na gestão e gerenciamento de resíduos sólidos, deve ser observada a seguinte ordem de prioridade: não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos. Contudo, confirma a utilização da tecnologias visando à recuperação energética dos resíduos sólidos urbanos, desde que tenha sido comprovada sua viabilidade técnica e ambiental e com a implantação de programa de monitoramento de emissão de gases tóxicos aprovado pelo órgão ambiental.

 

Ademais, dispõe o Decreto que a utilização de resíduos sólidos nos processos de recuperação energética, incluindo o co-processamento, obedecerá às normas estabelecidas pelos órgãos competentes. E, a recuperação energética dos resíduos sólidos urbanos deverá ser disciplinada, de forma específica, em ato conjunto dos Ministérios do Meio Ambiente, de Minas e Energia e das Cidades. Entretanto as diretrizes não se aplica ao aproveitamento energético dos gases gerados na biodigestão e na decomposição da matéria orgânica dos resíduos sólidos urbanos em aterros sanitários.

 

 

A melhor energia é a economizada

 

Os projetos de eficiência energética podem contribuir, de tal forma, que o aumento de energia proporcionado fique atrás apenas da hidroeletricidade, nos próximos 20 anos. Não bastasse este potencial estratégico, a utilização eficiente de energia proporciona o uso mais inteligente dos recursos financeiros, preserva o meio ambiente e favorece a sustentabilidade do ciclo de negócios de energia. Todavia, as políticas públicas capazes de “premiar a eficiência” e fazer deslanchar este mercado promissor estão ainda muito incipientes.

 

Temos um potencial energético extraordinário a partir de projetos de eficiência energética. Talvez pela memória do risco de apagão, nos anos de 2001 e 2002, ainda persiste a ideia de que a eficiência está associada a corte de energia e a redução da produção.

 

Um preconceito que começou a ser desmistificado a partir dos dados do Plano Decenal no horizonte de 2019, elaborado pela EPE. No Plano, os projetos de conservação de energia já respondem pela economia de 23,3 terawatt-hora (TWh), volume suficiente para poupar a construção de uma usina com capacidade de gerar 4.800 megawatt (MW), um potencial superior ao que será produzido pela hidroelétrica de Santo Antônio, no Pará, quem tem 3.450 MW de potência.

 

Se considerada a demanda total por energia, que inclui também o consumo de combustíveis, a economia pode ser ainda maior. A EPE calcula uma conservação de 4,5% da demanda global esperada para 2019 com os projetos de eficiência energética. Isso equivale a 257 mil barris diários de petróleo.

 

Já estudo elaborado pela CNI (Confederação Nacional da Indústria) aponta que a economia poderia chegar a R$ 85 bilhões até 2030, em meio a um cenário de crescimento do país mais acelerado que a média global. Além disso, 250 milhões de toneladas de gás carbônico deixariam de serem emitidos na atmosfera.

 

Entretanto, o Brasil nunca teve uma política de eficiência energética de longo prazo, principalmente voltada para o setor industrial, responsável por 40,7% de toda a energia consumida no país. Enquanto a soma dos consumos de energia dos setores residencial, comercial e público responde por 15,8% do total consumidos. 

 

O Plano Nacional de Eficiência Energética precisa estar voltado a ser complementado por linhas de financiamento. A redução de juros e a expansão da carência de linhas de financiamento são aspectos fundamentais para acelerar os programas do gênero.  

Na condição de membro da Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, venho defendendo há tempos a elaboração e aprovação da Política Nacional de Eficiência Energética com a implantação das seguintes propostas:

 

– Associação de ações de eficiência energética a ganhos ambientais;

– Elaborar programas federais específicos para o setor industrial, estimulando o diálogo permanente entre a indústria e o governo na sua elaboração;

– Estruturação e difusão de dados que permitam maior segurança nas decisões sobre projetos de eficiência;

– Criar instrumentos de fomento para a realização de diagnósticos de instalações industriais;

– Estímular as PPPs (Parcerias Público-Privadas) para pesquisa e desenvolvimento de equipamentos e processos industriais eficientes;

– Adoção das normas ISO para consumo de energia;

– Promoção dos chamados contratos de performance entre ESCOS e o setor público;

– Aquecer o mercado de “Green Buildings” (prédios sustentáveis);

– Adoção da etiquetagem de produtos/empresas como critério para orientar as concessões de financiamentos/isenções fiscais pelo setor público.

– Criação das “Usinas Virtuais”, que é e de um criar um mercado de contratos de ganho em eficiência energética;

– Adoção dos Programa Municípios Energoeficientes;

– Utilizar o poder de compra do Estado para privilegiar produtos/empresas que estejam compromissadas com a eficiência energética.

 

A disseminação de projetos de energia eficiente é estrategico para aumentar a competitividade do país e também proporciona a redução de emissão de poluentes e de impactos ambientais e sociais, fazendo com que ela possa, finalmente, desempenhar um papel estratégico na nossa matriz energética.

 

Portanto, a composição e a combinação de energia e sustentabilidade deve ser uma marca do presente e do futuro, porque há uma pressão da opinião pública no sentido da adoção de políticas públicas sustentáveis contribuindo para que a eficiência energética seja definitivamente nelas incorporada nas políticas públicas.

O sentimento de urgência em relação a práticas sustentáveis e renováveis de produção de energia não contagiou os líderes globais durante a Rio+ 20. Limitaram-se a uma declaração de princípios pressionados pelo imediatismo da crise econômica.

 

Surpreende o fato de não terem reconhecido que novos parâmetros para o setor de energia, de transportes, de construção sustentável e de outros paradigmas podem exatamente ser o eixo dinâmico de uma nova economia, a economia de baixo carbono, a Economia Verde.

 

Mesmo sendo a maior conferência realizada pela ONU, se considerados os eventos paralelos que mobilizaram a sociedade civil, ONGs, empresários e governos, o documento “O futuro que queremos”, é muito limitado. Isso se constata, sobretudo, no parágrafo que descreve o conceito de Economia Verde, vago e genérico, como apenas um entre vários modelos econômicos viáveis, e sem que os países tenham qualquer obrigação  estímulo para de adotá-lo.

 

Mas a reunião em si representa uma vitória, marco pela consolidação do conceito de desenvolvimento sustentável e pela divulgação e conscientização sobre melhores práticas econômicas, ambientais e sociais.

Energia e sustentabilidade, caminho de oportunidade para que o Brasil seja vanguardeiro no Mundo, eixo dinâmico da Economia Verde!

 

Arnaldo Jardim deputado federal PPS/SP;

Engenheiro Civil Poli-USP;

Membro da comissão de Minas e Energia da Camara dos Deputados.

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