Arnaldo Jardim
Desde 2003, quando estabeleceu uma meta de substituir 20% dos combustíveis convencionais por combustíveis alternativos até 2020, a EU debate se os biocombustíveis são uma solução para o aquecimento global ou são parte do problema.
Para os críticos, as culturas energéticas – como cana-de-açúcar, a beterraba, dendê, milho, soja, trigo- concorrem com a produção de alimento, o que levaria ao aumento do preço das commodities agrícolas e, consequentemente, ao agravamento da insegurança alimentar. Esse debate, “food versus fuel”, transformou-se rapidamente em uma verdadeira campanha antietanol e tem sido um dos principais argumentos contra a criação de um mercado internacional do biocombustível.
Acusam também os biocombustíveis de fomentarem o desmatamento ilegal e de invadir áreas com grande capacidade de absorção de CO², como as florestas, não se justificando, portanto, o seu uso para a redução das emissões. Mais uma barreira contra o etanol brasileiro, mesmo depois de aprovado a Política Nacional de Biocombustíveis, Renovabio, cuja certificação impede a utilização de áreas desmatadas ilegalmente.
Não bastasse tanto protecionismo, eis que, durante as discussões pré-Cúpula G 20, as delegações europeias apresentaram mais um pretexto: o princípio de uso em cascata, segundo o qual deve existir uma hierarquia para o uso da biomassa, de acordo com o valor agregado. Prioritariamente, alimentação humana; nutrição animal, na sequência; e, somente por último, produção de energia.
Enquanto isso, o Bloco Europeu vem aumentando, ainda que lentamente, a produção de biocombustíveis. Segundo dados da Statistical Review of World Energy, a região produziu, em 2021, 302 mil barris de óleo equivalente por dia de biocombustível (mbll). Quarenta milhões a mais do que 2015, quando a produção alcançou 260 mbbl.
Na Alemanha, a maior produtora de biodiesel do continente, a produção, curiosamente, se concentra no cultivo da Colza, uma oleaginosa temperada cujas sementes são consideradas a segunda fonte mundial de proteína. Além da produção do óleo de Canola, suas folhas são utilizadas na alimentação do gado. Hoje, a Colza é matéria-prima para 44,5% do biodiesel produzido nos 28 países-membros do bloco.
Outro exemplo interessante é da França, onde a venda de etanol aumentou 13% em 2022, atingindo 1,47 milhão de metros cúbicos. A produção francesa do biocombustível já consegue suprir aproximadamente 40% do consumo interno, concentrada no cultivo do trigo e, principalmente, da Beterraba, a mesma matéria-prima, por sinal, utilizada para produzir o açúcar. Os franceses insistem no tubérculo, mesmo que o etanol produzido tenha um custo de produção entre de US$ 0,48 a US$ 0,60/litro, ante US$ 0,21/litro quando se utiliza a cana-de-açúcar.
O interessante é que a competição por áreas agricultáveis parece não ser um problema para os agricultores europeus. A Dinamarca cultiva 76,8%, do seu território; a Irlanda, 74,7%; os Países Baixos, 66,2%; o Reino Unido, 63,9%; e a Alemanha, 56,9%; mas, onde o prejuízo à produção de alimentos será maior, é no Brasil, que possui apenas 7% de seu território com a agropecuária.
Não há dúvidas, portanto, de que o Brasil desenvolveu a melhor alternativa sustentável do mundo para substituir os combustíveis fósseis e somente argumentos protecionistas podem distorcer essa realidade. A União Europeia, historicamente resistente à importação de combustíveis renováveis das Américas, imporá tantas barreiras quanto necessárias para proteger seus agricultores.
Por isso, nossa defesa deve ser energética em defesa dos biocombustíveis, por ser, atualmente, a forma mais custo-efetiva para descarbonizar a matriz de combustível. Com méritos, o Brasil assumiu o protagonismo nesse setor e busca, cada vez mais, fortalecer essa posição. Na última AGRISHOW, por exemplo, a maior feira de agronegócio da América Latina, mais uma prova da nossa convicção pelas energias renováveis: um pacote de medidas do governo de São Paulo para incentivar, ainda mais, a produção de biocombustíveis no estado.
No âmbito federal, merece destaque a aprovação do PL do Combustível do Futuro, do qual sou relator na Câmara dos Deputados, que amplia a mistura do etanol e do biodiesel nos combustíveis fósseis, insere o Biometano na matriz energética brasileira e fomenta a produção de biocombustíveis para descarbonizar outros modais de transporte, como o setor aéreo e a navegação.
A defesa dos biocombustíveis deve ser uníssona. Por isso, foi reafirmada na Audiência Pública que a Comissão de Transição Energética e Produção de Hidrogênio (CEENERGIA), realizou no dia 14/05, com a presença do Assessor Especial do Ministério da Fazenda, Rafael Ramalho Dubeux; e será reforçada, no dia 25/06, em evento da Comissão que contará com a participação do Embaixador André Aranha Corrêa do Lago, secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores.
Os biocombustíveis são Patrimônio Nacional, fundamentais para o Brasil se manter no protagonismo da transição energética.
Arnaldo Jardim é deputado Federal é presidente da CEENERGIA e da Frente Parlamentar da Economia Verde e vice-presidente da Frente Parlamentar Agropecuária.
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