Arnaldo Jardim
O Brasil é um caso de sucesso, com cerca de 80% da matriz formada por fontes renováveis de energia, enquanto países desenvolvidos buscam chegar a um nível de 10% para atender o Protocolo de Kyoto. Todavia, essa realidade que nos diferencia começa a perder espaço com o uso de fontes mais poluentes e caras que impactam no bolso dos brasileiros.
Estudo do Instituto Acende Brasil alerta que os resultados dos últimos leilões de energia nova, realizados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), apontam para um aumento significativo do uso de termelétricas movidas a óleo combustível. Considerando os últimos sete remates de energia nova, realizados desde 2005, contata-se que foram comercializados mais de 5 mil MW médios de energia de projetos deste tipo, 35% do total negociado, de cerca de 14 mil MW médios.
Desta maneira, somos o único país a sustentar o crescimento de seu parque gerador com base nessa fonte de energia, que geralmente é utilizada para complementar o suprimento em períodos de pico e não continuamente.
Estimativas apontam que a conta do acionamento das térmicas a óleo combustível já ultrapassou a barreira dos R$ 1,2 bilhão e começa a pressionar as tarifas das distribuidoras. Afinal, a geração térmica a óleo combustível apresenta um custo de R$ 382,00 MWh, muito acima do registrado pela geração hidroelétrica (R$ 105,00/MW/h) e pela geração térmica a gás natural (R$ 164/MWh).
Em São Paulo, por exemplo, o reajuste anunciado pela Aneel será de até 16,36% e atingirá mais de 2,5 milhões de consumidores. O peso do uso deste tipo de térmica responde por 2,3% do aumento da CPFL Piratininga e por 3,16% da Bandeirante.
Na prática, este quadro é resultado de um conjunto de fatores desfavoráveis e da ausência de um plano estratégico para a definição da nossa matriz energética, capaz de estabelecer o papel que cada fonte deve desempenhar, seja a hídrica, o gás natural, a biomassa, a nuclear, entre outras.
O nosso sistema elétrico vem padecendo da escassez de projetos de hidroelétricas, principalmente pelas barreiras impostas na concessão de licenciamento ambiental, fato que agrega um risco desnecessário para os investidores, além da redução dos inventários de bacias hidrográficas por conta da dificuldade técnica de elaborar os estudos na região Norte, considerada a nova fronteira de geração hídrica.
Enquanto isso, o gás natural, apontado como fonte preferencial de complementaridade às hidroelétricas, atravessa uma crise crônica de abastecimento. Em razão da constante crise institucional que atinge o nosso principal fornecedor, a Bolívia (responsável pela oferta de 30,8 milhões de metros cúbicos dia, diante de um consumo doméstico diário de 61,2 milhões de metros cúbicos), além da falta de novos investimentos na produção doméstica, principalmente nas Bacias de Campos, Santos e Espírito Santo. Não é de se estranhar à ausência de projetos de termelétricas a gás natural nos mesmos sete leilões de energia nova.
Sem falar no resultado do primeiro leilão de energia a partir da biomassa da cana-de-açúcar, que deixou muito a desejar, diante de um potencial de produção atual de 5,3 mil MW, dos quais 3 mil MW compõem o excedente. No leilão realizado pela Câmara de Compensação de Energia Elétrica (CCEE), as usinas sucroalcooleiras comercializaram apenas 548 MW de energia, para entrega a partir de 2009. O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) esperava 2 mil MW adicionais no próximo biênio, mas só 44 usinas depuseram garantias para disputar o leilão e 31 venderam energia.
Fato que, inclusive, ensejou a apresentação de requerimento para a realização de audiência pública na Comissão de Minas e Energia, já aprovado, mas ainda sem data para sua realização. O objetivo é colocar na mesa de discussão o governo, parlamentares, empreendedores e especialistas para buscar superar os entraves em relação ao preço da bioeletricidade, ao prazo de entrega e a infra-estrutura de conexão destes empreendimentos à rede de distribuição de energia.
Nós, parlamentares, devemos concentrar esforços para produzir a segurança regulatória necessária, no sentido de evitar a consolidação de um quadro de instabilidade energética no médio prazo, seja pela inércia ou pelo viés intervencionista.
Enquanto a Lei do Gás continua empacada nos corredores do Senado, já existem membros da base aliada interessados em alterações profundas na Lei do Petróleo, para dar mais poder ao Governo e a Petrobras, em detrimento dos investidores privados. Assim como, na Câmara dos Deputados, ainda não conseguimos avançar na aprovação da Lei das Agências, uma garantia de independência técnica, política e financeira fundamental para estabelecermos um ambiente estável para novos investimentos.
Em meio a este “tsunami financeiro” que pode contaminar a economia real, inibindo a atividade industrial, o insumo energia não pode ser mais um componente de risco para a sustentabilidade econômica. Afinal, essa crise vai passar e depois da tempestade sempre vem a bonança. Precisamos de alicerces fortes para iniciar um novo ciclo de crescimento e a questão energia é estratégica.
Deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP) – membro da Comissão de Minas e Energia da Câmara Federal.
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